16.2.11

Eu, hipocondriaca, me confesso!


Foto da capa do livro : Hipocondria - Nove Vidas Atormentadas de Brian Dillon

Agora que sei que o controverso Charles Darwin sofria de hipocondria, e que ainda assim conseguiu com o seu Beagle ir para o outro lado do mundo construir a teoria da evolução das espécies, estou muito mais confiante de que esta doença não me roubará a imaginação em troca da loucura. Sabendo agora que nomes sonantes da nossa história, passavam os dias a interpretar sinais e sintomas do seu corpo e mesmo assim foram capazes de desenvolver actividades notáveis, deixa-me uma sensação de alívio por constatar a possibilidade do meu legado não ser somente gavetas cheias de exames clínicos ou caixas repletas de medicamentos. Posso, ainda, ter esperança, de que serei capaz de deixar ao mundo mais do que isso. Até então, achava que esta mania me privaria de alcançar os píncaros da criatividade, a epifania intelectual, o pináculo da minha veia artística, uma vez que passava o tempo a tentar convencer o meu próprio cérebro de que as tonturas de hoje, a dispepsia do dia anterior e a taquicardia da outra semana, não eram fruto de uma qualquer doença grave e incurável mas antes reflexo de uma personalidade ansiosa e preocupada, em demasia, com o funcionamento do próprio corpo. Ora isto desgasta, consome, cansa, rouba neurónios que poderiam estar dedicados, em exclusivo, a algo mais produtivo e interessante do que aumentar a lista de doenças que conhecemos.

Ser hipocondríaco não é fácil. É saber, sem ter passado pela aprendizagem de medicina, uma série de coisas que as pessoas, ditas normais, nem fazem ideia do que se trata tal como conhecer quase todas as doenças existentes e ainda os tratamentos disponíveis; como saber dizer, de cor, o valor das pulsações, da tensão arterial, o nível de colesterol, de glicemia e de hemoglobina; como ir ao médico e trocar opiniões sobre a origem de determinado sintoma; como saber distinguir entre artrose, artrite e fibromialgia. Já para não falar na gestão de stocks de comprimidos na carteira, na assiduidade em frente à televisão para assistir ao House ou ao Serviço de Urgência, nos sites de medicina que enchem os favoritos. São horas desperdiçadas a aumentar o conhecimento sobre temas que apenas servirão para exacerbar a mania de que o corpo nos trai a qualquer momento. Viver a imaginar doenças é direccionar o nosso poder fantasioso para pensamentos ocos e sem qualquer valor acrescentado para o bem-estar físico e mental.

Mas agora que sei que Marcel Proust não se viu impedido de escrever só porque sofria de doenças imaginárias, me sinto muito mais enquadrada numa realidade que, não sendo de todos, é, pelo menos, de algumas mentes brilhantes. E parafraseando aquele escritor francês remato este post dizendo que "Para tornar a realidade suportável, todos temos de cultivar em nós certas pequenas loucuras."

10.2.11

Amar o amor!

Gosto de amar o amor, de me desvanecer no seu abraço. Gosto do amor forte, do amor arrebatador, quente, capaz de debelar a respiração. Gosto do amor avassalador, tirano da alma, alienador. Rejeito o amor piegas, isolado na lamechice, obstinado pelo cliché, preso ao acanhamento e à palidez. Gosto do amor vivo, vermelho, omnipresente; do amor que tudo quer. Não me revejo no romantismo massificado, dos jantares à luz de velas num qualquer lugar-comum, das rosas vermelhas entregues com cartões fabricados. Gosto da surpresa, do tremor, do inesperado, de oferecer vassalagem a um amor que se oferece à imensidão. Não me convencem com frases feitas e ideias de outros mas conquistam-me irremediavelmente com a originalidade nas palavras, a criatividade na paixão, a singularidade nos actos. Gosto do amor que se vê só de ser sentido, do amor que jamais se esquece mesmo que fenecido.