28.2.10

A cumplicidade teve um dia

Hoje é um dia especial, poder-se-ia dizer, atendendo a uma lógica paradoxal, que é um dia quase esquecido porque já se encontra naquela parte da memória que armazena os acontecimentos que jamais se esquecem. E é por isso que nem sempre sendo lembrado, este dia jamais cairá no esquecimento.

Hoje comemora-se a cumplicidade, o seu início e a sua promulgação como sentimento que não se esquece, mas que se sente em toda uma vida, que se percepciona com todos os sentidos e que é tão discreto que adormece ao colo. Hoje celebra-se a cumplicidade que une e que convida a juntarem-se a ela todos os outros sentimentos que a sustentam.

A cumplicidade teve um dia, e não foi de chuva como hoje, nem de cinzentismo, nem de vento, nem de inverno. Foi um dia feliz, e os dias felizes são grandes, solarengos, claros, cheios de raios de luz e de primavera na barriga.

Hoje a cumplicidade faz anos e não está velha, está nova, bonita, ciosa por não necessitar de ser lembrada para nunca ser esquecida.

27.2.10

Adoro ver para além de olhar


Mudar

Gostava sinceramente de ir para bordo de uma aventura diferente. Algo que me desse especial prazer, arrumando os obstáculos à porta. Ter a coragem de mudar. E não é fácil mudar. Não é fácil prescindir de um equilibrio garantido para abraçar o incerto.
A estabilidade é necessária e eu preciso dela com avidez, preciso de um chão fixo que não balance mas... infelizmente sou estavelmente instável, solidamente insatisfeita, intranquila numa tranquilidade que todos me associam.
Preciso de entrar a bordo desse navio que me leve a outro porto, a outras gentes, que me teste, que me desoriente para me ensinar a equilibrar.
Preciso da mudança, estou cansada da estagnação, de barcos que não andam, comandados por comandantes obsoletos sem carta de navegação. Quero aprender a nadar, aprender a perder o medo de mergulhar, aprender a somente depender do meu apoio mesmo sabendo que há quem nunca me desampare. Quero renovar, redefinir-me, dar-me outra imagem ou mostrar a certa, quero agradar as minhas pulsões, desfazer complexos, aumentar os meus graus de liberdade.
Mas não consigo. Agora não consigo e ontem também não. Amanhã concerteza serei coerente. Sempre o fui. Coerente no meu medo de mudar.

E o grito saiu assim

Ahhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhhh

26.2.10

Horas

Levamos a vida em horas. Horas para acordar, horas para sair de casa, horas para chegar ao emprego, horas para almoçar, jantar, para entregar determinado relatório, horas para lazer. Os restaurantes têm horas de funcionamento, os cinemas têm sessões a horas certas, os aviões seguem escalas horárias.
Período, escala de tempo, intervalo de tempo, horário, são tudo confinações que temos de cumprir para não cair em desoras nem em atrasos.
Ser muito cedo, ser demasiado tarde, tudo tem referência a horas. Somos vítimas das horas, tiranizados por um espaço temporal, enganados por acharmos que somos verdadeiramente livres.
Está na hora de me deitar mas ainda aqui estou, porque apesar da hora, me sinto com vontade de debitar umas quaisquer letras sem sentido. Mas o despertador já tem na sua memória a hora a que deve soar a primeira música da manhã, precisamente 15 min antes da hora a que me devo levantar.
Está na hora, pois quando mais ela passa menos eu a aproveito. A hora fica, o tempo de sono não.
Está na hora de ir, e de ficar noutro local, durante outras horas, inexoráveis.

21.2.10

Massive Attack (escrito a 11.02.10)


E para acabar com o périplo de Londres, termino com a descrição do concerto a que assisti no Hammersmith Apollo. Ambos gostamos dos Massive, ambos não os conseguimos ver em Lisboa quando em Novembro pisaram o Coliseu do Recreio, por isso ambos fomos fomos ouvi-los no seu país natal num dia gelado (-2ºC) mas onde se viviam emoções quentes.


Eram 21h27m quando entraram em palco num recinto cheio. Aguardavam-nos cerca de 5000 pessoas, a lotação máxima do recinto, havendo somente espaço para a adrenalina de quem aguarda boa música.

Eramm 23h15m quando terminaram de tocar um reportório de músicas capaz de satisfazer nostálgicos e curiosos já que embalaram a sala sons mais antigos, como "tear drop" ou mesmo um "karmacoma" cantado após encore e como remate final de um espectáculo que custou abandonar. Mas também houve lugar a música "fresh", acabadinha de sair da editora 3 dias antes , um albúm novo e aguardado pelos milhares de fãs da banda e que levou ao palco Damon Albarn, pela sua especial participação no recente disco.


Houve bons argumentos para ninguém ter saído desiludido, bom espectáculo visual, às vezes monopolizador de toda a atenção devido ao seu tamanho impacto, boas vozes, bons músicos e sem poder deixar de referir o lado filantropo do concerto que, com fins de beneficiência não deixou esquecer o povo palestiniano, as desigualdades mundiais e as diferenças sociais, expostas em muitos watts de luz.


Para mim o único senão, o pequeno grão de areia no sapato é que o meu percentil de altura é demasiado pequeno para ver em pé , em condições, um espectáculo rodeada de ingleses. Mas nada que um português não desenrasque, afinal de contas a música é acima de tudo para ser ouvida.

Londres (escrito a 11.02.10)


Gosto de Londres . Gosto de Londres porque sim. Porque é retórico perguntar a razão porque se gosta de uma cidade quando esse gostar não tem explicação, meramente porque se sente e sentir é o acto subjectivo mais difícil de transpôr para palavras, ainda mais que façam sentido aos outros.

Gosto de Londres porque sim, porque acho que ele (ou será uma ela?) também gosta de mim e sabemos que há amor mútuo quando há troca de afectos. Ele dá-me o que eu gosto de receber, eu recebo de bom grado o que ele gosta de me dar. É a troca justa, a razão da nossa fidelidade.

Para o ano há mais. Porque sim. Porque acredito na fidelidade e porque entre nós continuam a existir argumentos de troca.

18.2.10

Avião (escrito a 11.02.10)

Escrevo enquanto viajo num A320 da Companhia Tap Airlines com destino a Londres. Para mim, deve ser das vezes em que o acto de escrever é tão mais penoso que qualquer actividade socialmente aceite como causa de mau-estar, como o é por exemplo uma ida ao dentista.

O que me custa não é o debitar das palavras, já me habituei a escrever sobre demasiados contextos, de modo que o conteúdo é já pouco assustador e propiciador de me pôr uma "pilha de nervos". O que me custa muito, ai se me custa, (e só de pensar o acto de custar já custa mais um pouco) é todo este ambiente hostil que me rodeia. Tenho perfeita noção que o adjectivo hostil é uma hiperbolização oriunda de uma experiência pessoal e subjectiva e não deriva de todo de algo factual. Mas a verdade é só esta, tenho muito medo de andar de avião. Medo irracional entenda-se, daquele imune aos argumentos mais convicentes que me possam dar, daquele que se transforma em pavor à menor visualização de um esgar mais sério vindo de uma qualquer comissária de bordo, ou à mais leve turbulência mais digna de se apelar de "abanãozinho"

Por isso resolvi insistir com o meu cérebro apavorado e fazer deste exercício uma espécie de catarse, onde tento escrever sem filtros de consciência, simplesmente escrevendo tudo aquilo que me aterra na mente (até as palavras são coerentes ao momento), para ver até onde consigo ir debaixo do peso desta ansiedade.

Tentando (ainda que neste momento somente tremulamente) fazer uma análise à origem deste medo, acho que pode provavelmente derivar do facto de odiar tudo o que fuja ao meu controlo, o que ao ser paradoxal poderia por si só resolver a questão desde logo, ou seja se não controlo o melhor será mesmo me descontrair e deixar-me levar pela conhecimento dos outros. No entanto, se isto funciona com os outros comigo nem por isso daí as horas que passo fechada num sítio como este são verdadeiramente difíceis de descrever porque o medo emudece qualquer apreciação que possa fazer de uma paisagem aérea, da placidez de um bando de nuvens, da hegemonia de um céu azul.

Não consigo, a adrenalina não deixe que entre poesia nas minhas veias, como se houvesse apenas lugar para uma delas na minha circulação. Somente sinto vibrações, percepciono sobressaltos, agitações, asas que tremem, apitos que tocam com insistência, gente que se mexe apertada, e o meu coração que fala comigo como nunca fala em outras circunstâncias, com pancadas fortes, eloquentes, assertivas.

Só desejo ouvir a voz que me chega por altifalante a anunciar a descida, sentir novamente a pressão na barriga a indicar a diminuição de altitude, esforçar-me por olhar timidamente pela janela (mini) para poder apreciar a paisagem (o que nem sempre funciona se existir demasiada água e eu não vislumbrar quaquer pista de aterragem), ouvir aquele barulho horrível mas desejável do trem de aterragem, e sentir a pressão das rodas no chão ao mesmo tempo que o meu coração descansa um pouco da sua frequência absurda de batidas.

Bom, isto é o que sinto, mas a outra verdade é que também adoro viajar e entre a luta de um coração piegas e a de uma mente curiosa pelo mundo lá fora, esta última tem conseguido ganhar. Talvez por isso já tenho algumas horas de avião no meu currículo, tantas como de benzodiazepinas no estomâgo e espero sinceramente aumentar estas horas, ainda que todo o ciclo se repita.

15.2.10

Blackberry, Blackcurrant, em português simplesmente amora

palavras que se gostam porque o som transmite prazer aos nossos sensores auditivos, ou porque nos relembram momentos bons ou simplesmente porque são pinceladas de coisas boas que são voláteis mas se deixam apanhar quando ouvimos o som da palavra.

Passa-se com amora, palavra doce, aromática, tão inconscientemente perto, que quase toca a palavra amor, tão gustativa, a minha cor favorita. Um campo de amoras ou um blackberry field.

Abandono a amora aromatizada mas mantenho a amora e globalizo-a para berry, a minha new berry, outra parte de mim, avulsa, às vezes com pouco sentido para terceiros, nem sempre doce, às vezes amarga, mas sempre colorida de amora e always com blackberry thoughts.

Bem vindos à minha nova baga que sendo amora portuguesa abandona o "black" para que em estrangeiro seja a cor que se quiser.