Roma recebeu-nos com honras de chuva. O avião pousou sob o olhar cinzento de um céu que durante todo o dia chorou. Apesar de desanimador, e fortemente limitador da liberdade de escolha do que visitar, a verdade é que o mau tempo não foi capaz de fazer frente à motivação da descoberta, por isso, sem grandes delongas, e protegidos da melhor forma que encontrámos contra a àgua que nos atingia o corpo, iniciámos os primeiros passos pela cidade. Roma já teve o estatuto de capital europeia com maior número de turistas. Não sei se mantém esse lugar de estrelato mas, a avaliar pela quantidade de massa humana que abunda nas suas estreitas ruas, fazendo o adjectivo caótico parecer um eufemismo para descrever o seu centro histórico, tudo parece indicar que a fama ainda se mantém. Foi a pensar nessa imensidão de pessoas inapropriada para quem, acabado de chegar, aprecia ambientes mais relaxantes que, esquecendo por momentos os locais de referência, procurámos percorrer as ruas na procura de uma Roma menos revelada pelos guias turísticos. E ela existe. Ninguém me disse, eu própria destapei o lençol que cobre alguns locais de Roma desconhecidos ainda para muitos e pude, assim, comprovar que o lado alternativo desta cidade é capaz de oferecer locais sossegados e repletos de espaço livre, ideais para olhos que preferem ver singularidades a amontoados de pessoas.
Um desses exemplos é o museu Maxxi, dedicado à criatividade e laboratório da experimentação artística que não pretende ser somente um espaço de exposição mas também de inovação cultural. Além de estar situado num edifício de 27 000 m2 de arquitectura moderna, contrastante com os tons e com o estilo da Roma clássica, é um espaço urbano que enche os olhos e que cativa qualquer máquina fotográfica. O seu conteúdo é exemplar, equivalente ao de uma Tate Modern ou de um MoMA, e encontra-se exposto em espaços de múltiplos ambientes que convivem em sequências coerentes e harmoniosas. Aprovadíssimo, ainda mais depois de ter degustado o seu delicioso brunch tomado num espaço amplo e cheio de luz.
Mas quem vai a Roma tem de ir ao seu centro histórico e por isso depois destes momentos iniciais marcados pelo afastamento da desordem romana, ganhámos, finalmente, coragem para acariar os afamados locais do seu centro histórico. Percorremos a Via Veneto, descemos os degraus da Piazza di Spagna, subimos a Via del Babuíno e estacionámos as pernas na Piazza del Popolo enquanto o ar se enchia com as nossas gargalhadas por vermos as centenas de pessoas que por ali deambulavam, algumas à laia de passeio, outras atraídas pelas inúmeras lojas de comércio, capazes de esvaziar qualquer carteira e produzir um mundo de sonhos. Não foi fácil gerir a nossa caminhada por entre os outros corpos de passos apressados ao mesmo tempo que fugíamos da chuva evitando goteiras, pingos e outras fontes de água.
Por falar em fontes, no sentido literal do termo, e depois de termos calcorreado a Via del Corso aguardámos pela presença eloquente da Fontana di Trevi que seria um monumento grandioso não fosse o facto de ser ofuscada pela imensidão de gente que, de moeda na mão, procura, segundo a tradição, concretizar o desejo de voltar novamente áquele local. É tarefa quase impossível fotografá-la sem que algum braço, mão ou cabeça se intrometam, insidiosamente, no desejado retrato.
O rio Tibre foi atravessado para ir ao Estado do Vaticano porque visitar Roma e não ver o Papa, ou pelo menos tentar fazê-lo, seria uma afronta a todos os familiares e amigos que, ao saberem que viajaríamos para a capital italiana, imediatamente nos perguntaram se iriamos ver o máximo representante da igreja católica. Pois bem, procurámos não defraudar as expectativas e eis-nos numa manhã solarenga em frente à Basílica de São Pedro (com mais uns milhares, é certo) a olhar avidamente para a janela que alberga os discursos papais. Não vimos o Papa nem vimos a capela sistina, pois a nossa paciência fugiu para longe assim que avistou a fila para entrar, mas gostámos de ver a grandiosidade da Piazza de San Pietro, a singularidade da Guarda Suiça e a quantidade de objectos para venda que ostentam a cara do Papa actual e do anterior, fazendo jus aos mais variados gostos. Mas este lado do rio não acolhe somente o apogeu do catolicismo mas também outros espaços menos ortodoxos e bem mais mundanos, aglomerados na zona de Travestere, tais como galerias de arte, livrarias, bares, restaurantes e outros locais de um comércio hip que vale bem a pena uma visita demorada.
Mas o Colisseo é, sem dúvida, o ex libris da cidade, imponente como só ele sabe ser e com um dourado guarnecido pelo pôr-do-sol que lhe confere uma fotogenia fantástica e um vício para retinas sensíveis. É olhá-lo, olhá-lo até o deixarmos de ver para nos deliciarmos com a imponência da Piazza Venezia e do seu monumento a Victor Emanuel. Em Roma tudo acontece como uma sucessão de visões magníficas que quase se atropelam para conquistar a atenção dos ociosos. Não há momentos mortos para os sentidos pois tudo surge numa sequência de deleite visual, olfactivo e, muito principalmente, gustativo com todos os capuccinos, gelados, pastas e tiramisus que fazem da comida italiana uma referência gastronómica mundial.
Os tons ocres da cidade encontram contraste nos seus magníficos parques, apaziguadores da agitação da cidade e que nos fazem conciliar com a natureza alheando-nos do facto de estarmos no meio de uma cidade ampla e em contínuo movimento. Passear pela exuberância de vegetação, aproveitando miradouros, palacetes e espaços para degustar excelentes paninis, deverá fazer sempre parte do percurso de quem visita Roma.
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